domingo, 9 de junho de 2013
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'Alckmin politiza a questão da segurança', diz Cardozo
Ministro da Justiça diz que tucano joga responsabilidade para governo federal em vez de dialogar
Depois de passar uma semana às voltas com invasões de índios em Mato Grosso do Sul, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, mexeu em outro vespeiro. Cansado de ser responsabilizado pelo aumento da violência em São Paulo, Cardozo disse que o governador Geraldo Alckmin está "politizando" a segurança pública, de olho na eleição do ano que vem
veja a entrevista que ele deu ao Jornal ESTADÃO
"Infelizmente eu acho que é isso, que ele está politizando", afirmou o ministro ao Estado. Ao garantir que o programa federal de policiamento das fronteiras tem apresentado resultados positivos, Cardozo apontou o dedo para Alckmin e falou em "hipocrisia" na política. "Vamos deixar a disputa para o palanque", reagiu. "Querer atribuir a subida da violência a algo que está melhorando é querer se isentar de um problema sobre o qual poderíamos pensar em conjunto, sem politizar nem jogar a responsabilidade para o outro."
Com discurso de candidato, o ministro do PT negou que pretenda enfrentar o tucano Alckmin nas urnas, em 2014, mas foi enfático ao dizer que a população de São Paulo precisa de pessoas "à altura" de seus desafios. "Já passou o tempo do quanto pior, melhor", resumiu. Para Cardozo, só com "varinha de condão" seria possível resolver todos os problemas do ministério. "No dia em que problemas acontecem em todas as áreas dá vontade de comprar o estoque inteiro de Maracugina da farmácia".
O sr. foi censurado pela presidente Dilma depois da morte de um índio terena por ter permitido o cumprimento da ordem judicial de reintegração de posse de uma fazenda sem que houvesse aparato policial para isso?
Em nenhum momento a presidenta me censurou ou censuraria o cumprimento de uma ordem judicial. O que ela determinou foi que eu verificasse se houve algum tipo de abuso no cumprimento dessa ordem. Naquele caso houve uma morte e, obviamente, é dever nosso investigar e verificar se algum agente público envolvido foi além do que devia no exercício da função.
Qual a solução para esses conflitos? O governo poderá compensar índios com outras terras e indenizar fazendeiros?
Tem gente que fala em permuta de terras, coisa que não é aceita por povos indígenas. Há os que sugerem indenização, mas isso esbarra na Constituição e existe também proposta para criação de um título da dívida indígena. Por mais que o governo queira resolver o problema, se não envolvermos o Judiciário, o MP e, em certa medida, o Legislativo, não sairemos dessa situação. Nossa ideia é criar um fórum de negociação sobre a questão do Mato Grosso do Sul. Não considero aqui a hipótese de que pessoas estejam de má-fé. Se essa negociação prosperar, pode servir de modelo para todo o País.
O governo pode suspender todas as demarcações feitas até agora?
Esse é um pleito feito com muita frequência. O Ministério da Justiça tem o dever constitucional de demarcar e, portanto, o que podemos fazer é melhorar o processo de demarcação.
A Funai age com viés ideológico, incentivando a onda de invasões?
A Funai tem papel importantíssimo na política indígena e na demarcação das terras. Mas, mesmo quando está certa, os atingidos nos seus direitos acham que é suspeita. Se o Ministério da Justiça conseguir fazer o papel de mediação de conflitos, ouvindo todos os lados, construiremos um processo que será visto com mais isenção.
A Polícia Federal também investiga a responsabilidade sobre boatos que provocaram corrida às agências da Caixa para sacar benefícios do Bolsa Família. O sr. disse que a ação foi orquestrada. Por quem?
O que eu disse é que não poderia descartar a hipótese de ação orquestrada, o que é muito diferente. Seria incorreto e leviano atribuir agora responsabilidades. O fato de ter ocorrido o saque em momento específico em vários Estados - no Rio, por exemplo, apenas na Baixada Fluminense - não nos permite afastar a hipótese de que alguém, propositadamente, tenha disseminado o boato. Uma das linhas de investigação, sobre a qual só falo porque veio a público, é a do telemarketing. É uma investigação altamente complexa.
No ano passado, o sr. afirmou que, se fosse para cumprir pena em um presídio brasileiro, preferiria morrer. Está fazendo um mea-culpa por não ter conseguido resolver os problemas até agora?
Eu disse que as condições de grande parte dos presídios brasileiros são inaceitáveis. Quase todos são estaduais; só há quatro federais. Os presídios federais têm um padrão de respeito a direitos que ninguém questiona. Estamos investindo R$ 1,1 bilhão para os Estados poderem fazer unidades prisionais e atacar a superlotação. Tivesse eu uma varinha de condão para resolver todos os problemas que passam por esse ministério, seguramente eu poderia ser equiparado a uma divindade. Há uma hipocrisia tão grande na vida pública que, quando um governante coloca luz sobre o problema, as pessoas se espantam e acham que é um mea-culpa.
O governador Geraldo Alckmin disse que a violência em São Paulo é agravada pela falta de controle do governo federal sobre as fronteiras. Como resolver isso?
É da tradição política as pessoas tentarem se isentar de responder certas questões, colocando a culpa em outros. Eu não farei isso. Vamos deixar a disputa eleitoral para o palanque. Em junho de 2011, lançamos o Plano Estratégico de Fronteiras e temos obtido resultados muito positivos. Querer atribuir a subida da violência em São Paulo a algo que está melhorando é querer se isentar de um problema sobre o qual poderíamos pensar em conjunto, sem politizar nem jogar responsabilidade para o outro.
Então o sr. acha que o governador está politizando a questão da segurança?
Infelizmente eu acho que é isso, que ele está politizando, porque se o programa de fronteiras tem números melhores do que tinha anteriormente e São Paulo tem números de violência piores do que tinha antes, eu não posso estabelecer um nexo de causa e efeito. Muitas vezes, a cabeça de organizações criminosas que fazem o tráfico não está no local onde se planta a coca; está no grande centro onde é o consumo. Então, para combater o tráfico temos de combater a ação criminosa em todos os seus aspectos. Se ela está em presídios, tenho de ter coragem para enfrentá-la nos presídios. Segurança pública exige coragem política. Se eu tenho um grande centro de consumo, tenho de fiscalizar bem essa fronteira, além da fronteira nacional, para evitar que a droga chegue ou que o dinheiro saia.
Existe um jogo de empurra sobre falta de segurança. De quem é, afinal, a responsabilidade?
A responsabilidade é do Estado brasileiro. Acho que todos nós temos de estar juntos e parar com essa mania de querer empurrar a coisa com a barriga, culpando uns aos outros. Isso chega a ser pueril. Em momentos de crise, precisamos deixar de lado nossas divergências políticas e buscar convergências. Duvido que a população aceite esse jogo de empurra.
As críticas do governador ao programa federal seriam uma vacina para ele se proteger na campanha da reeleição, já que, segundo pesquisas, sua popularidade começou a cair?
Se eu respondesse a essa pergunta e desse as minhas impressões estaria seguindo o caminho inverso do que estou querendo. Quero resolver o problema de São Paulo e não dizer, eleitoralmente, que o culpado é esse ou aquele. A população de São Paulo precisa de pessoas que estejam à altura de seus desafios, para enfrentá-los em conjunto. Nós não podemos ter vergonha ou medo de pedir auxílio quando temos um problema. Pouco me interessa aí o resultado eleitoral. Já passou o tempo do "quanto pior, melhor".
E o que fazer, então?
Vou dar um exemplo: Alagoas está dentro do Brasil e também se submete ao mesmo programa de fronteiras. É o Estado mais violento do Brasil. O governador de Alagoas, Teotônio Vilela, que é do PSDB, pediu apoio e, em um ano de programa de fronteiras, o Estado reduziu em 15% os homicídios. Santa Catarina também estava com um problema gravíssimo com uma organização criminosa. O governador Raimundo Colombo (PSD) veio até nós e propusemos uma parceria. Qual foi o resultado? Em um único dia transferimos 60 presos. Ao mesmo tempo, fizemos um cercamento das fronteiras do Estado de comum acordo e uma ação nos presídios. Aquela situação calamitosa se resolveu. Será que não é possível a gente pensar um pouco maior nessas coisas? Eu acho que é possível.
A redução da maioridade penal melhoraria o problema?
A redução da maioridade penal é inconstitucional porque fere cláusula pétrea. A Constituição diz que a maioridade penal é conseguida aos 18 anos. Isso, portanto, gera um direito individual indiscutível a todas as pessoas que não têm 18 anos de não serem imputadas pela prática de delitos penais. Temos de focar a discussão nos marcos do Estado de Direito. A partir daí podemos discutir, por exemplo, as condições e o tempo de internação, associados a políticas de ressocialização do menor transgressor.
Ministro, o sr. quer concorrer ao governo de São Paulo?
Não. Eu não sou candidato. Não tenho projeto pessoal de disputar eleição e falo isso com muita sinceridade. Só se houvesse uma Assembleia Constituinte exclusiva para votar a reforma política eu me candidataria a uma vaga (risos). O PT tem ótimos nomes, como o dos ministros Aloizio Mercadante (Educação), Marta Suplicy (Cultura), Alexandre Padilha (Saúde), Guido Mantega (Fazenda)...
No PT é comum o comentário de que o ex-presidente Lula veta seu nome porque não perdoa sua atuação na sindicância de 1997 que culpou Roberto Teixeira, compadre dele, por tráfico de influência em prefeituras petistas. Ele também não teria gostado da ação da PF, que investiga Rosemary Noronha, ex-chefe do escritório da Presidência em São Paulo.
Minha relação com o presidente Lula é excelente. Em nenhum momento recebi qualquer consideração, mesmo levemente crítica, da parte dele em relação ao comportamento da Polícia Federal no caso Rosemary Noronha. Ele sempre foi um grande incentivador da atuação independente e republicana da PF. Em relação a situações passadas, foram totalmente superadas.
Embora o sr. diga que não vai disputar a eleição, o seu discurso sobre segurança pública é de candidato. Segurança pode ser o mote da campanha do PT em São Paulo?
Se meu discurso fosse de candidato eu estaria nesse momento de dedo em riste contra o governador Alckmin, apontando falhas da segurança e tentando colocar culpas nele, o que eu não estou fazendo.
Não?
Não. O discurso de candidato é o daquele que tenta empurrar para outro a responsabilidade que lhe incumbe.
Há muito problema na articulação do governo Dilma e o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB), falou até em "vexame". O preço para manter a aliança com o rebelde PMDB não é alto demais?
Quando há uma relação de parceria, e não de submissão, é normal que existam tensões. A parceria com o PMDB é indestrutível e tem dado bons frutos. Não creio que situações episódicas possam afastar essas forças.
Não são nada episódicas ...
Eu fui secretário de Governo da então prefeita Luiza Erundina e competia a mim fazer a articulação política. O tempo inteiro se dizia que a culpa pelas tensões era minha. Eu ficava pensando: "Será que eles têm razão?" A partir daí comecei a observar todos os governos e não conheço um em que não se diga que a articulação política não é culpada por alguma coisa.
O sr. disse que a parceria com o PMDB é indestrutível, mas com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), parece bem frágil...
É absolutamente legítimo que o governador queira seguir o caminho que acha que deve. Evidentemente, esse é um processo político. Gostaria que ele estivesse conosco, apoiando a candidatura Dilma Rousseff, mas não tenho motivo para recriminá-lo.
O senador Aécio Neves, provável candidato do PSDB à Presidência, adotou como mote o combate à inflação. Como sair da armadilha do "Pibinho" com preços e juros em alta?
Sou advogado e, quando você pega uma causa difícil, sempre se pergunta como a outra parte vai fazer para sair dessa. Hoje eu fico pensando como a oposição faz para atacar uma presidenta com a popularidade que Dilma tem. Não deve ser fácil encontrar discurso. Situação difícil essa do senador Aécio...
Mas pesquisas indicam que a economia é um assunto que pode pegar...
Vivemos uma situação de crise mundial. É evidente que, se não houvesse essa crise, estaríamos com outro desempenho. Mas a política do governo está ajustada, vivemos com pleno emprego. Ter pequenas turbulências num cenário mundial como esse é natural.
O novo ministro do Supremo Luís Roberto Barroso afirmou que o julgamento do mensalão foi um "ponto fora da curva" e que a Corte endureceu. O sr. concorda com essa avaliação?
Eu não posso falar sobre isso. O ministro da Justiça não pode emitir opiniões sobre decisões tomadas por outro poder. No dia em que eu sair daqui pode ter certeza que falarei tudo o que penso sobre o julgamento do mensalão, sobre todos os as aspectos jurídicos que eu teria vontade de comentar.
O mensalão ainda pode causar impacto na campanha da presidente Dilma, se a sentença de prisão for cumprida em 2014?
Não creio. Francamente, eu acho que esse debate se exauriu quando da sentença condenatória do Supremo. Prolongar essa discussão para impingir desgaste à presidenta Dilma é algo completamente fora de propósito.
O sr. é favorável à proposta de emenda constitucional 37, que limita o poder de investigação do Ministério Público?
O pano de fundo dessa PEC é uma disputa que considero nociva ao interesse público. O Ministério Público e a polícia têm um papel muito importante para o País e, portanto, há espaço para conviverem em harmonia no combate à criminalidade. Acho que é possível reservar um espaço de investigação em certas matérias para o MP e a competência ordinária comum de investigação para a polícia. Muitas vezes há críticas ao MP pelo fato de sua investigação ser feita sem limite e sem regras. Embora eu atribua ao MP muitas das transformações positivas que o Brasil teve no combate à improbidade, nos últimos anos, é claro que existem pessoas que incorrem em abuso de poder. São exceções, mas existem. Lembro da velha frase de Montesquieu (o filósofo francês Charles Montesquieu): "Todo homem que tem o poder tende a dele abusar". O MP, portanto, tem de ter um regramento limitador da sua atuação quando investiga, até para o bem da instituição.
Então o sr. acha que o MP deve pedir autorização à PF para investigar?
Não. Sou favorável a uma definição de campos de investigação. Eu, pessoalmente, defendo que o MP investigue corrupção, por exemplo. Temos uma comissão coordenada pelo secretário de Reforma Judiciária, Flávio Caetano, que tentará chegar a um acordo até o próximo dia 26. Votar essa PEC da forma que está é o pior dos mundos e só contribui para o acirramento da disputa entre as duas instituições.
Há procuradores dizendo que a tentativa de enfraquecer o MP seria uma represália às investigações contra réus petistas do mensalão e questões envolvendo o governo. Como o sr. responde?
Isso é fantasioso. Todo mundo sabe que a origem dessa PEC é uma disputa corporativa envolvendo delegados de polícia e MP.
Mais de um ano se passou e a Comissão da Verdade ainda não apresentou resultados sobre os crimes da ditadura. O sr. acha plausível a revisão da Lei da Anistia para responsabilizar agentes de Estado que cometeram crimes?
O governo não apresentará nenhuma proposta de revisão da Lei de Anistia. A Comissão da Verdade tem total autonomia para investigar e está fazendo um trabalho excelente.
O sr. lida com assuntos que vão de índios a segurança, passando por direito do consumidor e Polícia Federal. Para ser ministro da Justiça é preciso tomar Maracugina?
Acho que não só tomar Maracugina como jarras de calmante. Esse ministério é um aprendizado no qual a gente convive permanentemente num clima de tensão profunda. No dia em que problemas acontecem em todas as áreas dá vontade de comprar o estoque inteiro de Maracugina da farmácia. É um trabalho exaustivo, mas recompensador quando você percebe que alguma atividade sua deu certo. Talvez isso nem sempre seja visível aos olhos da população.
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